sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

Com açúcar e com afeto

De ontem para hoje presenciei três cenas que me fizeram observar, talvez com mais tolerância, o porquê de vivermos numa sociedade onde ninguém quer envelhecer.
Há os pontos óbvios de vivermos em tempos descartáveis e do desprezo por quem não exerce função produtiva ou que já não produz com a mesma avidez, desprezo não desdenhoso, mas indiferente.
Meu sogro era médico e me dizia que tudo o que “somos” é basicamente hormônios, produzidos à medida que deles se tem necessidade, ou seja: numa etapa fisicamente produtiva. Eu achava que era exagero médico, mas a verdade é que ele foi um leitor precoce da época em que vivemos e que na verdade sempre esteve à frente do seu tempo. Aqui não vai crítica a procedimentos de rejuvenescimento, quem sou eu pra criticar os que desbravam essa selva em que vivemos? Ao contrário, é bom nos cuidarmos para sermos independentes o maior tempo possível, o que não quer dizer adolescermos a ponto de disputarmos um modelitcho numa boutique para adolescentes. O conhecimento e a sabedoria nem sempre andam de mãos dadas e no embate imaginário entre as duas forças, quem vence é Lorde Google. Se o conhecimento está na ponta dos dedos para que sabedoria? Esse conceito é tão radical que mesmo quando já não é mais possível correr a uma velocidade enlouquecedora, corremos. Corremos com medo de ficarmos sós, com medo de sermos descartados, amedrontados pelas decisões e caminhos tomados no passado, quando achávamos que estávamos apenas diante de um ensaio e que em algum momento um diretor teatral abriria as cortinas do palco para descobrir nosso inigualável talento, e assim redimidos viver nossa vida plena. Enquanto vivemos vítimas voluntárias do julgamento alheio somos como a mosca que fascinada pelo brilho da lâmpada está cada vez mais próxima do fim.
Com açúcar e com afeto fui ao doce predileto, Chico Buarque, ontem à noite. Sentada na platéia admirei o senhor de setenta, mais seguro do que nunca e tranqüilo com ele mesmo retratando um mundo em doses menores, talvez, ciente da idade e do seu tempo.
O show foi até bem tarde, a fome bateu, mas o sono venceu. Assim que: a receita imaginada fica pro fim de semana. Bon appétit toujours!

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