terça-feira, 10 de janeiro de 2012

A história do aipim e do couscous

Acabo de chegar de um almoço muito saboroso promovido pelo movimento slowfood do Brasil. A chef Tereza Corção preparou um cardápio muito saboroso com opção vegetariana a base de aipim. Para a entrada um cuscuz (de aipim) seguido por baby aipim com desfiado de alho poró e para terminar pudim de açaí (acho que com farinha de aipim) com 2 coulis e ‘torresmo’ de açúcar e farinha de mandioca, pode parecer repetitivo, mas garanto que não..
O aipim é de cultura endêmica brasileira e é muito interessante como se intercala com cardápios de outras culturas sem a menor dificuldade, um exemplo disso é o cuscuz ou couscous procedente do oriente médio. No Brasil o cuscuz chegou com a comunidade marrana vinda do Marrocos que se instalou no norte do país e usou a mandioca (aipim, macaxeira) no seu preparo. O couscous é original do Magreb (Marrocos) e os marranos que aqui chegaram não encontrando cevada, painço e nem outros grãos com os quais estavam acostumados a preparar o prato mais tradicional da sua culinária conheceram a farinha de mandioca com os nativos da Amazônia e do Pará adaptando a receita original a farinha local sem deixar nada a dever ao prato original.
Os primeiros marranos chegados do Marrocos alcançaram o norte do país por volta do século XVIII e muitas das comidas que agregamos ao nosso cardápio, principalmente no norte e nordeste do país têm raízes nesses judeus ibéricos cristianizados por força da Inquisição que imigraram para o Brasil. Talvez alguns pratos como o cozido e a feijoada de origem hispano-portuguesa, além dos outros ensopados da culinária ibérica e holandesa tenham origem na "adafina" (coisa quente) marroquina, o Tcholent, (chaud lent?) prato tipicamente judeu que celebra o shabat. Seu preparo começa quando a primeira estrela desponta no céu da sexta-feira e termina de cozinhar lentamente no calor para servido na hora do almoço do sábado.
Muitos de nossos hábitos e também nosso mobiliário são reflexo da influência dos marranos na vida do povo brasileiro. Corria a boca pequena, por exemplo, que algumas mesas usadas nas copas de engenhos tinham gavetas nas quais comensais escondiam a comida quando visitas surpresas apareciam, avareza? Mais provável que tivessem medo de ser flagrado em seus pratos alimentos kasher ou do ritual do shabat o que comprometeria a fidelidade de seu juramento como cristãos novos e poderia levá-los às mãos da inquisição.
A comida tem essa coisa fascinante e poderosa capaz de fazer tradições diferentes juntarem-se num único prato, unindo cristãos e marranos, gregos e baianos, ou não...